segunda-feira, 5 de agosto de 2019

"Dans le Café de la Jeunesse Perdue"

Mulligan’s of Poolbeg Street, Dublin in March 1953: Billy Brooks Carter of Texas loved Mulligan’s  so much he requested some of his ashes be kept in the grandfather clock. Every eight days, the staff “wind up Billy”


Há vidas extraordinárias, outras que nada têm de digno ou brilhante, enquanto que muitas são apenas isso, existem, arrastam-se na sua banalidade ébria, nunca estando bem, nem aqui nem ali, nesse contentamento descontente... Vivem?

Mas todas se encontram, de um modo ou de outro, de comboio agasalhados num livro, de carro
embalados pelo canto do mar, ou sós, pelos passos perdidos entoados nas calçadas que para lá caminham.

Entro...
O fumo ascende em espirais, o cigarro descansa no cinzeiro do balcão consumindo-se como um passar de vida lento e escuro. Olhares de esperança vã cruzam-se a medo na penumbra que os vai acolhendo em cada final de tarde frio, final... Os copos, grossos, altos, baços do uso e da gordura das mãos que os levantam em compassos rítmicos apurados e ensaiados por dias com anos dentro de não ter conta.
Gargalhadas ousam ecoar, esporádicas, espaçadas, distorcidas do ambiente que as envolve, soturno,
denso do mesmo fumo que os abraça, difusos ao início de cada noite.

Conversas cruzam-se nesse ar, falares sussurrados, confidências e discussões em línguas proibidas e
gastas como as bocas que as entoam... cânticos religiosamente ensaiados, melodias passadas, hinos, são carregados pela pauta da noite que chegou e pediu um copo também.

Daqui não levas nada... para cá, trazes tudo e de tudo deixas no banco alto a teu lado ou no fundo do copo que entornas por ti numa solidão assistida de consolo fugaz.

Não esqueces, descansas... não perdeste a tua vida, nem os problemas que ela tem, não desapareceram na espuma espessa do liquido negro que te alivia a alma, nem tão pouco no fumo que enche a divisão do cheiro acre que já não sentes.

Elas voltam... voltam sempre, tristeza e solidão abraçadas num compasso de dança em teu redor,
observadas pelo medo que traga dum copo médio o liquido amarelo que o alimenta.

Todos pertencemos aqui, eu, tu, todos, os que sabemos, os que já soubemos e mesmo aqueles que nunca vão saber...

Há noites assim... vamos bebendo, conversando enquanto o fumo dos cigarros se evapora no ar... e a música é cantada em tons lentos... mas a lucidez não nos deixa, nem o álcool inebria ao ponto de... nos perdermos... perdemos sempre...

Há noites assim... não sei se são boas ou más, são o que são tal como a vida é o que é...

A euforia não chega, a alegria não aparece, a vida mantém-se, os sentidos viajam... estás... revisitas sítios e momentos que já não existem, que não tens, esses bancos de bares de canto, felizes na sua sujidade escura, vazios agora, sós... como nós... ruas, esquinas, até casas de banho de ocasião, do momento que recordas em flash, vazias, frias, mas as memórias ficam, sempre... quartos de hotel, restaurantes... dias, noites entre sonhos e realidade... sonhos...

E depois... um olhar, um raio castanho de luz que envolve, que te cerca, por meio do nevoeiro em cortina de fumo, a esperança tímida nesse esgar que julgas não merecer... será...

(Título pedido de empréstimo do livro com o mesmo nome de Patrick Modiano)

domingo, 23 de setembro de 2018

Amor verus numquam cedit




Há muito que já não deixava umas linhas neste local…

Li e acabei nos últimos tempos dois livros que muito queria ler, conhecer e saborear. Livros que de alguma forma fizeram parte de um imaginário, de um crescimento enquanto pessoa, sempre pela via da adaptação, fosse ela cinematográfica ou animada, mas nunca a obra em si. Eram livros cujas traduções que haviam para a língua de Camões, ou simplesmente não existiam ou eram más e por isso tornaram-se ao longo dos anos projectos adiados à espera de se cumprirem… e cumpriram.

Tanto os Três Mosqueteiros de Dumas como Drácula de Bram Stocker são clássicos novecentistas da literatura europeia, obras magmas dos seus períodos mas não chegando a ser obras maiores da literatura mundial. E a leitura de ambas, ao longo dos últimos meses formou em mim essa mesma opinião. Gostei muito de os ler, não me desiludiram em nada relativamente ás esperanças que neles depositava, mas não serão, de longe, os melhores livros que já li, nem tão pouco obras de literatura que acendam aquela chama em nós que os tornariam livros de uma vida. Bem escritos, contam histórias muito bem imaginadas, cheios de detalhes e condicionantes de época que por vezes se tornam verdadeiras delícias ou preciosidades, devidamente contextualizadas.

Os Três Mosqueteiros, romance de capa e espada de pueril juventude, transporta-nos para o reinado de Luís XIII e do cardeal Richelieu, para os ecos recentes das guerras de religião francesa dos inícios do século XVII, para o complicado xadrez político europeu da época, onde as principais potências europeias se digladiavam em guerras pelo controlo e influência na Europa… o mundo não mudou assim tanto!!! Os feitos de bravura, a galanteria, passando por cenas de amor e ódio, pontuam a obra, recheando um história por demais conhecida, mas que ainda assim, nos surpreende em pequenos grandes detalhes que as adaptações não quiseram ou não acharam importante transportar. Como diriam os ingleses -  the devil is in the details…

Quanto a Drácula, é uma obra diferente, mais sombria, vitoriana, filha da sua época e de viagens e contactos que o próprio autor terá tido investigando sobre o folclore e a mitologia europeia. Em nada se assemelha, ou em muito pouco à aclamada realização cinematográfica de Coppola no início da década de 90. Muito menos sensual, muito menos romântica, no sentido e caminhos levados pelo filme. É mais intimista e centrada no ser humano, na maldade e nos locais mais obscuros da mente. Escrito em forma de diário não deixa de todo modo de se sentir a grande ligação do autor ao mundo do teatro, nas falas e no exagerado dramatismo das mesmas em certas partes do livro. Deliciosos os maneirismos linguísticos de Van Helsing, ou de alguns estivadores ou dos camponeses romenos, bem como a presença constante de um machismo descarado, típico da época.

Mas até mais que a experiencia literária que um livro nos deixa, são as memórias que deles e da sua leitura nos ficam, em associação com o nosso dia-a-dia e consequentemente com a nossa vida… e essas são talvez gratas e eternas memórias… lembranças de finais de dia mornos de Verão, acompanhados de quem amamos na Feira do Livro de Lisboa, onde ambos foram comprados; uma bela sardinha que se tornou o mais querido marcador de livros que tenho; memórias de leituras solitárias numa varanda iluminada por raios de sol poente, interrompidas pela voz de uma criança linda que chega com a mãe da escola e chama o nosso nome em plenos pulmões iluminando-nos a vida e trazendo um sorriso como só as crianças sabem fazer; lembranças de noites de leituras partilhadas e entrecortadas pelos mais incríveis momentos de paixão e partilha que um ser humano pode ter…

Desta forma sim, foram leituras memoráveis, que jamais vou esquecer e que anseio repetir…

sábado, 24 de agosto de 2013

sol lucet omnibus



 
   Desde pequeno que me habituei a que os incêndios florestais durante o Verão fossem uma companhia constante nos meios de comunicação social.

   Mas curiosamente ou talvez não, ao invés de com o passar dos anos, o aumento dos meios e dos conhecimentos, essa realidade ter tendência a ser atenuada, não o é. Bem pelo contrário, ano após ano a mesma farsa teatral, o mesmo uso inconsequente de meios e vidas tomam os seus papeis na perfeição para mais uma encenação, um pouco à laia daqueles filmes da industria de Hollywood que todos os anos, na época balnear, chegam ás salas de cinema para que os possamos ver, rir e não pensar em mais nada durante uma boa hora e meia de tempo perdido mas divertido...

   Mas os incêndios nas florestas portuguesas não me dão vontade de rir, a morte de pessoas a combate-los muito menos, antes pelo contrário.

   Como se não bastasse ver desaparecer, ano atrás de ano a nossa mancha florestal, que levará séculos a ser reposta, pois uma árvore não cresce de um dia para o outro, assistimos ao nosso jornalismo de eleição que com bastas provas dadas, continua a impingir a ideia de que o sol por obra e graça do espírito santo, com os seus longos raios toca ao de leve as árvores e as lança numa espiral de chamas demoniacas. Ou então, a segunda versão também é um clássico do chavão jornalistico, um bêbado, bandido, trôpego nos seus passos lançou uma beata ainda fumegante para um, cuidadosamente preparado, ajuntamento de caruma que instantaneamente entrou em combustão selvagem e em menos de uma hora temos um incêndio de 3 frentes a destruir uma serra inteira de área arborizada...

   Não, a industria da madeira, do papel, os interesses políticos e de grandes empresas em adquirir ou alterar zonas em áreas protegidas nada têm a ver com a vergonha nacional que são os incêndios florestais que se repetem todos os anos. Rigorosamente nada a ver! Falar nisso são devaneios de gente desocupada que com a sua mente pérfida cria a torto e a direito teorias da conspiração que não têm ponta por onde se lhe pegue... Só temos o grande azar de ter muito sol e muitos bêbados a deambular pelas nossas florestas.

   Para finalizar uma palavra de apreço para as instituições que têm cuidado das nossas áreas florestais pelos muitos anos de péssimas opções de (re)florestação com a introdução constante de tipos de árvores que pouco têm a ver com a nossa realidade mediterrânica e com as nossas específicidades atlântica em detrimento das nossas espécies autoctones que de á séculos cobrem de verde o nosso país. Obviamente que isto nada tem a ver com interesses instalados ou pura ignorância dos nossos excelsos governantes que nem a diferença entre um carvalho (Quercus faginea) e um pinheiro (Pinus pinaster) sabem...

domingo, 2 de junho de 2013

SPQL senatus populusque lusitania


Tapeçarias ditas de Pastrana - Pormenor D. Afonso V

   39 anos!
   Passaram 39 anos. Daqui por uns tempos estarão a comemorar tantos anos de vitoriosa democracia como aqueles que se passaram em cinzenta ditadura. Estarão, aquando dessa efeméride, no mesmo tom inflamado a gritar nas mesmas ruas em baixa definição, pessoas já elas cinzentas, 25 de Abril Sempre, Fascismo Nunca Mais...
Para os do costume, estarão de foicinha e punho, chavão fácil na boca, a atirar se por acaso estaríamos melhor na tristonha ditadura desses idos de Portugal a preto e branco?!
E eu não percebo!
 
   A democracia já viveu o suficiente para ser responsabilizada pelos seus actos. A ditadura já o foi, agora deve ser objecto de estudo, sério, para na paleta não ser nem branca, a contento de uns, nem preta, a vontade de outros, mas sim tecida naqueles tons de cinzento, nítidos para que quem a olhe a possa ler em alta definição e não apenas nas convenientes nuances que têm feito o deleite e a cartilha da esquerda nacional.
 
   A ditadura será sempre somente fascista e opressora na pena afiada dos vencedores de Abril, tal como o papão será sempre o Dr. Salazar, o "botas", que vem trôpego e muito velhinho naquele tom bafiento enviar as pessoas para Caxias... buuuuhhhhh. Afinal quem entretece a história, quem a escreve no imediato, quem a lança na linha da frente da propaganda, são os vencedores.
 
   D. Sebastião será, provavelmente para sempre, aquilo que os cronistas e apoiantes de Filipe II de Espanha quiseram que ele fosse... morto, vivo, com vergonha de regressar, maricas, aleijadinho ou com deficiências e incapaz de governar, louco...
 
   António de Oliveira Salazar também. Não foi de certo o anjo salvador e redentor, mas não terá sido o demónio sanguinário dos Rosas e pandilha...
 
   D. Carlos foi o gordo, que se ria da miséria do povo, déspota ao estilo do antigo regime, que só sabia comer e caçar, um asno ignorante, um fraco que apenas governou porque a monarquia impunha a hereditariedade... D. Carlos só foi pintado assim pela propaganda vencedora do partido republicano... por mais ninguém...
Passados mais de 100 anos da sua morte se calhar já o conseguimos, hoje, "pintar" nuns tons de verdade. Até já teve a graça de ser presenteado nessa Vila que ele adorava e onde era adorado com uma estátua, a olhar o mar...

   Mas falta cumprir Abril...
   Lamentavelmente não consigo concordar.
   Abril cumpriu-se, consumou-se em pleno para quem o fez, para quem dele reclamou o triunfo, aclamado e transportado em ovação. Mas porque a generalização normalmente conduz ao erro, talvez não se tenha cumprido para todos os que o fizeram ou a ele se colaram, mas cumpriu-se para os generais (capitães na época) de Abril, para os Soares, Almeidas, Sampaios, Cavacos, Santanas, Socrates, Barrosos e tantos outros patetas alegres que de nulidades assumidas passaram a pais fundadores de uma nação inventada que não se cumpre nem se constrói.
 
   Algo mudou, claro que sim. Coisas que hoje damos por adquiridas e não o eram á 50 anos. Mas se até o Estado Novo legou algumas coisas boas á posteridade, quase quatro decénios de liberdade e democracia também teriam de legar.
 
   Foram quase 39 anos de apatia política, de falta de responsabilidade social, de ignorância democrática que conduziram ao que hoje conhecemos, vivemos e criticamos... mas a democracia não se constrói na rua, não se aprende atrelado aos sindicatos nem ás máquinas partidárias, nem com comentadores que foram governo, que foram presidentes de câmara, que foram filósofos, que voltaram a ser governo para de novo serem comentadores e que nos conduziram a todos a onde estamos agora. Transversalmente da direita á esquerda o sistema está demente, podre, bafiento e nem foi preciso cair da cadeira... aliás não caiu!
 
   A mesma corja de políticos incompetentes, gananciosos, ávidos da coisa pública para proveito próprio que se apoderou do poder com a revolução liberal nos anos 30 do século XIX, é a mesma que governa hoje o país. Foi a mesma que prevaleceu em 1910, é a mesma que fugiu ou colaborou em 1932, é a mesma que ascende de 1974.
 
   Algo de muito mau se verifica quando quase duzentos anos depois se conseguem apontar as mesmas falhas á classe política de um país... Algo de inqualificável existe quando a única diferença entre ler sobre ela em Eça, Ramalho ou no Portugal Contemporâneo de Oliveira Martins e a realidade dos nossos dias, é a sua data de publicação...
 
   A memória curta, a par de alguns (muitos) outros defeitos, é um dos nossos mais graves problema com fundas raízes sociais. Chamo-lhe memória curta para não chamar ignorância consciente.
Pior, a rápida condenação dos figurões políticos na praça pública é sempre seguida de uma ainda mais rápida absolvição. Imaturidade infantil.
 
   Aqueles que dizem que nos governam, governam-se a eles próprios não a nós. Por certo desconhecem que a res publica, era na sua origem e fundamento a "Coisa Pública". Aqueles que nela governam, são mandatados por todos para a gerir em prol de todos, não de si mesmos. Mas tão grave é quem lá está não o fazer, como quem lá os colocou não os saber lembrar disso.
 
   Não atravessamos apenas crises económicas, atravessamos essencialmente crises de valores, crises de Ser. Invertemos tudo. Quem deveria servir, mandatado para isso, ao invés serve-se e banqueteia-se no cadáver moribundo.
 
   E isto é o pior que uma democracia pode ter, uma sociedade incapaz de fazer escolhas conscientes e sustentadas! Uma sociedade incapaz de fazer escolhas. Só isso explica este rotativismo ignorante que implantámos na nossa peculiar agenda democrática depois de 1974. Começamos agora, tristes quase cinzentos na era digital, a querer despontar, a querer perceber... a querer pensar! Será???
 
   Só poderei optar conscientemente, só poderei minorar o erro na escolha se conseguir diminuir a margem de manobra do dito erro. Isso consegue-se com conhecimento. Quando tenho duas opções, mais possibilidades tenho de fazer uma boa escolha quanto mais conhecimento tiver reunido sobre as opções que estão a escolha!
 
   As opções de escolha que garbosamente nos fazem encher a boca republicana e democrática são falácias. Gritamos a plenos pulmões que não queremos uma monarquia moderna, constitucional, democrática, em Portugal porque a hereditariedade que lhe está subjacente é uma afronta á nossa liberdade de escolha, á nossa sacrossanta liberdade de escolher o nosso chefe de estado...
MENTIRA! A nossa liberdade de escolha eleitoral democrática não existe pois se a monarquia se verga ao peso basilar da hereditariedade, a democracia republicana verga-se ao número da maioria, ás máquinas dos partidos e dos grandes interesses  e grupos económicos que os sustentam... Onde está a liberdade de escolha então? na letra da lei, na letra dos manuais pelos quais todos emprenhamos de promessas vazias, ocas e desmedidas, pelas quais hoje somos obrigados a dar tudo o que já não temos...
 
   Um país que se ignora nunca saberá viver em nada, seja Republica ou Monarquia, democracia ou ditadura. Se uns culpam o Estado Novo por ter desprezado a cultura e alfabetismo popular em detrimento de uma agenda de propaganda no enaltecimento desmesurado de períodos e personagens históricas, que condicionou de sobremaneira a historiografia nacional por largas décadas; outros não desculpam a agenda de massificação cultural e de desinteresse histórico que se verificou por largos anos no pós 25 de Abril. Se num primeiro momento encontramos a criação de mitos (muitos ainda hoje vão perdurando) e o endeusamento em cartilha da nossa história, no segundo momento encontramos o total desrespeito e indiferença pela história, tradições e cultura de um país com quase mil anos de existência...
 
   De "pecado" em "pecado" ardamos pois no "inferno"...
 
   Se evoluirmos enquanto sociedade não teremos dificuldade em singrar qualquer que seja o regime que conscientemente se escolha. Não será de hoje para amanhã que essa mudança vai acontecer, levará tempo, mas para que se cumpra é preciso começar e para a começar é preciso largar de vez estes falsos lugares de conforto que todos, de um modo ou outro vamos ocupando e partir. Assumir o leme nesta nau que é Portugal e encetar a rota que nos leve ao encontro de nós mesmos, enquanto povo, nação, país, inseridos no mundo que nos rodeia mas conscientes de quem somos e das escolhas e caminhos que queremos perfilhar. Sabendo que poderemos ter que fazer sacrifícios, mas que esses são em nossa prol e não para que outros possam lucrar, sabendo que poderemos ter pouco ou nada mas que isso irá conduzir a algo melhor e não apenas a podermos contrair mais dívidas em mercados exteriores daqui por um ou dois anos. Sabendo quem somos, poderemos valorizar e usar o que temos.

sábado, 9 de março de 2013

cruce signati

Regras e Definições da Ordem e do Mestrado de Nosso Senhor Jesus Cristo. Valentim Fernandes, 1504
 

   Todos conhecemos ou pelo menos já ouvimos falar da Ordem dos Pobres Cavaleiros de Cristo e do Templo de Salomão, comummente designados por Templários. Esta ordem de monges guerreiros, criada no século XII (1118) por um grupo de 8 cavaleiros está inserida no espírito de Cruzada e recuperação dos lugares santos que, desde a proclamação do papa Urbano II em Clermont-Ferrand em 1095, animava a Europa medieval.

   Apesar da pouco importância dada pela historiografia internacional ao movimento cruzadistico que ocorreu em paralelo na Peninsula Ibérica, ele é inegável e tem tanta importância como aquele que ocorria a Oriente. A provar isso mesmo encontramos registo da implantação destas ordens militares por toda a Peninsula logo após a sua criação. A ilustrá-lo temos a presença Templária documentada desde 1126/28 em território do Condado.

   A Ordem, prosperou, cresceu, enriqueceu e acabou por atrair sobre si demasiadas atenções que acabaram por lhe proporcionar a queda e extinção por toda a Europa. Em abono da verdade, descobertas recentes, nomeadamente um estudo dos manuscritos originais do processo, acabaram por comprovar o que há muito se pensava, que a extinção dos Templários teve a ver unicamente com questões de poder, financiamento e política e não com as heresias de que foram acusados. Como curiosidade, a prisão colectiva de todos os Templários franceses, incluindo o seu grão-mestre, Jacques de Molay, foi um acontecimento de tal magnitude, na época, que ainda hoje, o inconsciente colectivo, o relembra a cada Sexta-feira 13. O facto deste dia ser considerado maldito e de azar tem a ver com isso mesmo, o dia 13 de Outubro de 1307, uma Sexta-feira.

   Mas antes que me perca, pois o assunto, e a minha eterna paixão por ele, presta-se a isso mesmo, continuo esta pequena introdução que servirá para partilhar mais uma curiosidade da história pátria.

   Após a extinção da Ordem do Templo (1314), que acabou por ser alargada a todos os reinos cristãos da Europa, apesar de na maioria deles terem sido considerados inocentes de todas as acusações (como em Portugal), o papa deu indicação para que os seus incontáveis bens e património passasse para a Ordem de S. João do Hospital, também conhecidos por Hospitalários ou a partir da época moderna (século XVI) por Ordem de Malta.

   Em Portugal, reinando D.Dinis, após a extinção da Ordem, o rei criou a Ordem de Nosso Senhor Jesus Cristo (em 1319 pela Bula Papal ad ea ex-quibus) de modo a que esta herdasse tudo o que aos Templários pertencia, incluindo os monges-cavaleiros...

   Apesar de pouco veiculada pela historiografia nacional restam hoje poucas dúvidas de que a Expansão Portuguesa foi em grande parte obra apenas possível graças aos conhecimentos, vontade e recursos da Ordem de Cristo. Sem entrar em muitos detalhes mas para que se perceba, D. João I foi educado por D. Nuno Freire de Andrade, mestre da Ordem, o infante D. Henrique foi empossado como Administrador e Governador pelo Papa em 1420; a maioria dos descobridores eram cavaleiros e/ou escudeiros da Ordem de Cristo, Gonçalves Zarco, Diogo Cão, Bartolomeu Dias, Vasco da Gama, D. Francisco de Almeida, Afonso de Albuquerque, Pedro Álvares Cabral ou D. João de Castro, só para citar alguns dos mais conhecidos; e coincidentemente ou não, a reforma da Ordem, ordenada por D. João III e executada por Frei António de Lisboa, que a torna puramente religiosa, lhe altera a regra monástica e lhe impõe a clausura, coincide com o início do declinio do Império e do projecto Imperial Português.

   Depois desta introdução alargada para dotar o estimado leitor de algumas ferramentas históricas que sirvam de referência, atrevo-me a dizer que toda a gente de um modo ou outro conhece a simbólica e a imagética associada à Ordem de Cristo, nomeadamente a sua Cruz. Quer por recriações e descrições das caravelas e dos cavaleiros de Cristo, quer devido aos monumentos, principalmente os erigidos durante o reinado de D. Manuel I, através da Chancelaria das Ordens Honorificas da responsabilidade da Presidência da Republica, quer através de clubes de futebol (Os Belenenses) ou associações (Federação Portuguesa de Futebol).

   A cruz de cristo, baseada na cruz pátea templária, é originalmente uma cruz grega (isto é de braços iguais), pátea, de vermelho, carregada de nova cruz grega de branco (que terá como significado o renascer, sem mácula ou culpa da Ordem do Templo. Poderão haver outras interpretações simbólicas).

   Pois bem, posto isto, questionei-me o porquê de por vezes a cruz da Ordem de Cristo aparecer de alguma forma transmutada, nomeadamente, em cruz latina, ou seja, com o braço (ou haste) inferior a ter um comprimento desigual relativamente aos outros três.

   A resposta é simples, curiosa e não sem ironia mordaz...

   Como atrás referi, desde o infante D. Henrique que a ordem de Cristo está ligada directa ou indirectamente à Casa Real Portuguesa. D. Henrique era filho de D. João I, deste passou para o infante D. Fernando (filho do Rei D. Duarte), irmão de D. Afonso V, posteriormente, embora ainda não assumido totalmente pela historiografia, poderá ter passado para a infanta Dª Beatriz, mulher do anterior e depois para o seu filho mais novo e futuro rei de Portugal, D. Manuel. Este, era Administrador e Governador da Ordem quando, por testamento de D. João II, se tornou Rei de Portugal. Durante o seu reindo acabou por conseguir do Papa, através da Bula constant fide,e o titulo de Grão-Mestre e contou com esta elite, que já trazia meio século de experiência acumulada nas questões marítimas, de cruzada e descoberta do mundo, para implementar o seu projecto imperial nos “quatro cantos” do globo. Mas será já durante o reinado de D. João III que o título passará em definitivo e in perpetuum para a Coroa portuguesa. A Bula praeclara clarissimi, de 1551, torna os governo das Ordens, incluindo a de Cristo, hereditário e apanágio da Coroa. Embora, nesta altura, já pouco mais fossem que ordens religiosas e títulos ocos e honoríficos.

   Com a perda da indepência, após o deasaparecimento de D. Sebastião em Alcácer Quibir, Filipe, II de Espanha, aclamado, curiosamente nas cortes de Tomar em 1581, Rei de Portugal, herda também a Ordem de Cristo. Durante o seu reinado e o de seu filho vai proceder a reformas na Ordem e será nestas reformas que irá transformar a cruz grega de braços iguais na cruz latina que anteriormente referi, fazendo gala, obviamente, em marcar com essa simbologia toda a obra nova, que daí em diante se fizesse, para além da legitimação e do aspecto de pertença, também por toda a carga histórica e simbólica que a Ordem encerrava. Assim, nas fachadas dos edificios, pertença da dita Ordem, que pelo novo monarca foram renovados e/ou construídos, nos documentos e mesmo em peças de ourivesaria o novo formato da cruz é implantado amplamente.

   Eu diria que este comportamento é usual, quem chega de novo e se apropria de algo, quer, de um modo ou de outro deixar o seu cunho, a sua marca, testemunho da sua presença para a posteridade. O que são o dito estilo “manuelino”, e todas as campanhas de obras e restauros mandados fazer por D. Manuel, senão uma forma de afirmação de alguém que chega ao trono por nomeação testamentária e não por hereditariedade (obviamente que o estilo “manuelino” não se resume a isso, mas é-o também).
 
  Agora o curioso da questão é o que se passa a posteriori. E para o ilustrar vou apenas fazer referência a dois casos. A Federação Portuguesa de Futebol e, para mim a mais grave, a própria Chancelaria das Ordens Honoríficas da República Portuguesa a cargo de sua excelêcia o senhor Presidente da República. Estas duas instituições usam a cruz da Ordem de Cristo que se institucionalizou após as reformas de Filipe II e III de Espanha. Não existe aqui uma verdadeira culpa, pois, na verdade ninguém no reino, após a Restauração de 1640, até pela completa perda de importância em que havia caído a Ordem, se importou em devolver-lhe a sua simbologia original e convenhamos, portuguesa.

   Mas acho curioso que não se tenha o cuidado de procurar saber, principalmente quando se trata de instituições que representam o país ao mais alto nível, que tipo de simbologia se está a usar e porquê. Pois no nosso passado estão as nossas raízes, o nosso ser, e é irónico que a nossa Selecção Nacional de Futebol jogue com um emblema ao peito que foi institucionalizado por um rei espanhol, por uma “dinastia” estrangeira que governou o país durante 50 anos apenas, um emblema que na verdade só em nome se pode associar á ordem em questão; ou que o Chefe de Estado distribua condecorações que têm a sua simbologia ligada a um Rei estrangeiro (não é que isso tenha muita importância quando o mesmo senhor não está atento ao içar a bandeira nacional, deixando que seja colocada invertida).

Actuais Condecorações da Ordem de Cristo. Chancelaria das Ordens Honorificas da Presidência da Republica

   O nosso desconhecimento e consequente falta de respeito pela nossa própria herança histórico-cultural, traduz-se inclusivamente no desconhecimento e constante incorrecção de que somos alvo por parte do olhar académico estrangeiro. Isso entristece, porque a todo o momento se vê enaltecer os feitos dos outros por todo lado, mas dos nossos feitos e heróis ninguém se parece lembrar. A razão dessa atitude começa cá dentro...

   Não é, de todo, a legitimidade de D. Filipe, ou de seu filho e neto que está em causa, o caminho poderia ter sido outro, mas não foi. O que se discute aqui é o simples facto do símbolo em si. Se a ideia é que faça algum sentido que tenha algum significado, porque as pessoas rapidamente o reconhecem e com ele se identificam e assim o parece, por isso é e foi escolhido, então deveriamos estar perante aquele que orna os monumentos nacionais ainda hoje, aquele que um dia se enfunou com o vento favorável nas velas de um punhado de pequenas embarcações de madeira que cruzaram oceanos ou, aquele mesmo que estava inserido nas vestes dos cavaleiros e escudeiros desta Ordem que durante mais de dois séculos e meio estiveram ao serviço do país.

   É com esse que eu me identifico.

sexta-feira, 19 de outubro de 2012

cogito ergo sum

 

 

Que somos governados por um bando de incompetentes, corruptos, seres inaptos e completamente nulos culturalmente, que nem arte tiveram na sua maioria para conseguir uma formação académica sem recorrer a esquemas e compadrios, já todos nós sabemos, ou pelo menos deveriamos ter uma ideia.
 
Mas lá está, não é novidade. É assim desde o final da década de 70 do século passado, mais, até me arriscaria a dizer que é assim, desde o famoso 25 de Abril de 1974.
Qual é a grande diferença então?! O dinheiro. O malfadado e tão imprescíndivel tostão que nos permite tocar a nossa vidinha para a frente, não passar fome, ter aquela falsa sensação de conforto e no caso de alguns ter uma vida boa com recurso aos grandes avanços tecnológicos da nossa era. Pois é, até aos últimos anos, ninguém, ou para ser mais correcto muito poucos, se preocuparam com o que a “nossa” classe política de mentecaptos andava a fazer, e deram-lhe rédea solta, carta branca, um chequezito assinado em branco em cada eleição... Pois, pensavam que era um boletim de voto, não, não, era um enorme cheque colectivo, assinadito em branco por todos nós e que a dita da classe politico-poucochinha, aproveitou da melhor maneira, e foi como dizia o cronista, á muito, muito tempo, “fartar vilanagem”... Mas aí poucos se importaram, havia aumentos/actualizações de salários todos os anos, horas extraordinárias em barda, subsídios para toda a gente, lugares na função pública para irmãos e irmãs, primos, tios e sobrinhos, havia ainda o Néné, o Figo e o Rui Costa (hoje temos o Cristiano e anda triste), o Euro, os estádios, as autoestradas, as Capitais da Cultura e as Expos, universidades para todos, carros, casas, créditos e telemóveis em abundância, que começavam no analfabeto da aldeia perdida na Beira e acabavam no cirurgião de renome internacional com consultório na Av. da Liberdade em Lisboa. Foram anos e anos de um facilismo podre, um conto de fadas enganador, os bancos davam tudo, tudo era virado para o consumo, para a massificação. E os ladrões a meter ao bolso, PPP's, concessões a amigos, fraudes no mercado imobiliário, privatizações... Quer se goste quer não, este é o Portugal dos últimos 35 anos. Quer se goste quer não, todos, por inércia, estupidez, falta de educação política, cívica e democrática permitimos que isto que se vê hoje, que isto que tanta indignação causa hoje, chegasse ao que chegou. E permitimo-lo com o real traseiro sentado na poltrona a assistir de camarote!
 
Não é desculpa para o que estes atrasados mentais que nos governam estão a fazer ao país, pois não, o povo podia ter sido na mesma ignorante e estúpido e ter tido a sorte de apanhar políticos honestos... mas isso raramente acontece, porque a classe política, é de um modo geral o espelho do seu povo. Mas o interessante é ver que esta história do espelho já não interessa tanto falar-se dela, acho que fere algumas susceptibilidades (é só um feeling que eu tenho)... será consciência pesada! Será por toda a gente saber de um modo geral que o outro que está ao nosso lado tenta fugir aos impostos sempre que pode; será que temos plena consciência que temos de facto um grave problema de produtividade, porque muita gente passa um terço do seu dia de trabalho em ocupações que digamos, não está a ser paga para as fazer; ou ainda a velha questão das cunhas, compadrios e luvas, que todos sabemos que acontecem por todo lado, mas que quando nos toca a nós, rapidamente esquecemos o quão obscena nos parece a ideia para abraçarmos a causa com todas as nossas forças, mesmo que isso lixe (com F grande) a bom lixar, o tipo que esteve no concurso ao nosso lado e que só por acaso é vinte vezes melhor e mais competente que nós...
 
Pois é... espero ao menos que tenham consciência que por essas ruas e praças por onde se espraiam as manifestações, legitimamente indignadas, toda esta dura realidade que acabo de esplanar está lá de braço dado, punho erguido, cartaz cheio de piadolas sentidas e duras, verdadeiras, críticas aos nossos governantes, a desfilar , a sentir-se única, poderosa, invencível... e eu acho muito bem que assim seja, desde que exista lá no meio a tal consciência! (mas tenho as minhas dúvidas)
 
NÃO HÁ ALMOÇOS DE BORLA, já o dizia alguém, de um modo ou de outro eles vão ter de ser pagos, e normalmente a factura vem quando dói mais (além de que costuma ser por trás). A entrada para a moeda única teve um preço, alguém se lembrou na altura de perguntar quanto é que ia custar a “lagosta suada” que durante estes anos andamos a comer? Não me lembro de ter visto manifestações na rua, quando os patriarcas da democracia deste país traçaram o rumo e o nosso destino ao longo das últimas décadas em políticas europeias de agricultura, pescas, industrias de produção e transformação perfeitamente ignóbeis e destruidoras?! O facilitismo, o chico-espertismo, o que se lixe, recebo o meu ao final do mês, tenho a minha vidinha feita, eles que façam o que quiserem com o (meu) dinheiro dos impostos. Aliás, penso que não andarei muito longe da verdade, infelizmente, se disser que provavelmente poucas pessoas têm consciência de que o dinheirito que os políticos utilizam no dia a dia provém de todos nós! Pois só assim consigo perceber aquilo que é, aquilo que foi, o alheamento das pessoas em relação á vida política. Só assim consigo ter um laivo de desculpa para o que têm sido os episódios de exercício democrático neste país, em que serão mais as semelhanças com o mercado municipal ás Quartas do que com um regime de governação sério. Durante a nossa existência democrática o que se fez foi votar em quem dava mais, em quem prometia mais, até em quem tinha mais sex apeal, tal como nas bancas dos ciganos das praças e mercados, escolhemos aquele que tem mais lábia, o que fala melhor, aquele que tem os preços mais baixos, mesmo que se saiba que a mercadoria é roubada, que existem empresas que dão postos de trabalho que são lesadas com isso, mas mesmo assim, a clientela fiel lá está. O nosso sistema democrático é assim, na sua mais perfeita caricatura... anedótico!
 
Tão anedótico que recentemente tivemos o caso da substituição da frota automóvel da bancada parlamentar do PS, onde um tipo de nome Zorrinho (acho hilariante), diz básicamente (versão livre e traduzida!) - meus amigos se querem democracia, têm de arcar com os custos. Democracia é isto, eu ter motorista e andar de Audi, porque não vão querer que ande de Clio... É preciso dizer mais alguma coisa... pois, também achei que não!
 
Resumindo toda a gente sabe que os políticos são corruptos, toda a gente sabe que eles nos roubam, mas nada se faz, esperamos as licitações democráticas, escolhemos o meio termo entre as promessas de tirar menos e as mentiras de dar umas migalhas, e democraticamente elegemos as nossas cores... nada se faz, excepto, quando nos vão aos bolsos. Quando mexem no nosso sacrosanto ganha pão, nesse deus mundial do trabalho e da (in)justa remuneração do oprimido trabalhador pelo patronato malvado (Marx estaria orgulhoso), aí pára tudo! Alto e pára a feira...
Ele são os movimentos cívicos (acho que agora está na moda dizer apartidários, mas depois os cromos do costume andam lá na mesma a mandar umas bocas); ele é a esquerda toda de bandeira vermelha e t-shirt Che Guevara, que a maior parte da miudagem (aquela que milita nos J's e grita alto Fascismo nunca mais 25/4 sempre, em que a coisa mais inteligente que alguma vez pensaram foi na diferença entre a Super Bock e a Sagres numa noite de sábado no Bairro e alto lá...) pensa que era um tipo porreiro (pá) que aparece numas fotos a fumar uns charutos e que devia ser hippie e ter uma plantação de algo ilegal que dava altas “mocas”; uma infinidade de gente indignada, com razão, mas que só o é porque de repente, sentiram o chão a fugir debaixo dos pés, que é como quem diz viram um Coelho a ir ao fundo dos seus bolsos e rapar pouco que restava.
Não, infelizmente não houve uma mudança em Portugal, se as imposições, a tal factura, dos tais almoços que andámos a comer de borla (os de lagosta para alguns), que falava lá atrás, durante a últimas décadas, não tivesse chegado, tudo estaria igual ao de sempre. Mas agora há coisas a pagar, coisas que não podemos pagar e como os políticos são iguais aos chico-espertos que os elegeram, estão a fugir e a carregar de impostos e taxas naqueles que andaram iludidos durante todo este tempo. Então saímos para a rua e de repente o engraçado sr. Coelho, que á um ano e pouco foi heroica e democraticamente eleito esta prestes a virar coelho frito, e o sr. velhinho simpático que come bolo rei de boca aberta e diz que é presidente, também está pronto para o linchamento... E eu confesso que iria apreciar a coisa, se na mesma leva de fusilamentos franquistas, fossem os Soares e Sampaios, Socrates e Guterres, Louçãs e Jerónimos, Freitas e Portas e o resto da camarilha mafiosa. Mas depois penso, se assim fosse, será que 60% da população portuguesa se ia entregar voluntariamente para serem abatidos numa qualquer praça de touros. É que na minha maneira de ver as coisas, tão culpado é o que rouba, como o que manda roubar, como o que acendeu os holofotes, desenrolou o tapete vermelho e se sentou a ver o espectáculo...
 
É que estes bandidos estão a roubar-me, mas “eu”(um eu muito magestático entenda-se), além de os ter escolhido para me assaltar ainda me estive a lixar para o que esses gatunos andaram a fazer com o meu dinheiro ao longo de décadas. Agora que me foram ao dito, assim mais á bruta, qual é a minha moral para lhes chamar ladrões?!
 
Dizem – Portugal mudou depois do dia 15 de Setembro de 2012 – e eu penso, não sejam estúpidos por favor... ou então pelo menos não insultem a inteligência de quem usa a cabeça para um pouco mais que futebol, telenovelas e casa dos segredos. Nada mudou, apenas houve uma reacção a um conjunto de medidas idiotas, que conseguiu arrancar as pessoas á sua tradicional letargia cívica. Se amanhã este governo cair e o chupista do Seguro vier prometer mundos e fundos (que não tem, nem pode), o pessoal, aquele mesmo que mudou no passado dia 15, vai tudo a correr passar o tal cheque em branco, desculpem, por a cruz no boletim e elege-lo com mais de 30% dos votos...
Porque para que os políticos mudem, é preciso que primeiro mudem as pessoas, que evoluam, que se cultivem, que cresçam civicamente e olhem á volta com olhos de ver, para perceberem que se remarem para o mesmo lado conscientes das escolhas que fazem talvez cheguem a algum lado. Mas isso é uma mudança que demora mais do que por as contas do país na ordem, é uma mudança de mentalidades!


sábado, 11 de agosto de 2012

sanctum sanctorum?!


    Que existem coisas estranhas, todos nós sabemos. Que em Portugal pouco ou nada se liga à cultura e ao património também não é novidade, mas existem limites... ou pelo menos assim o pensava eu...
    No centro da cidade de Tomar, junto ao parque da cidade, ao rio Nabão e a uma grande unidade hoteleira, no largo Cândido dos Reis, existe uma pequena ermida (ou capela) consagrada a S. Gregório Nazianzeno (um dos santos doutores da Santa Madre Igreja, que viveu no século IV e “provou” a divindade de Jesus).
    Esta ermida, quinhentista, de planta octogonal, circundada por uma galilé em semi-circulo e com um interessante, embora modesto, portal manuelino, encontra-se como milhares de outras pelo país fora, de portas fechadas.
    O pequeno templo nada tem de especial, uma arquitectura curiosa mas não única, um interior despido, com excepção da imagem de S. Gregório no altar e de uns painéis de azulejos do século XVIII que até são originários do antigo Convento das Trinas de Lisboa.
    Por curiosidade apenas, tentei saber se haveria possibilidade de entrar na ermida. E havia!
    Ali perto existem uns sanitários públicos que têm um funcionário camarário lá destacado, que além de zelar por esse seu posto, é o fiel guardião das chaves da Ermida de S. Gregório... é esta a informação que é fornecida, até mesmo na internet.
    Percebe-se... estamos perante uma racional gestão de recursos humanos. Mas pergunto-me, não poderia estar o funcionário destacado na ermida com as chaves dos sanitários públicos em vez do contrário. Não sei, mas parece-me a mim que a imagem que se transmite, até para o turista, seria mais correcta desta forma... mais lógica. Vergamos as “necessidades” ao património, à cultura e não o inverso.
    Se neste caso que agora ilustro, a importância não será gritante, já noutros não será bem assim. Por este país fora muitos monumentos, alguns deles de cariz único no nosso país e mesmo na Europa, encontram-se em circunstâncias análogas. Ou seja o mau é que do caricato ou da excepção se faça regra... mas normalmente por cá é isso que temos!